Às três da madrugada (horário de Gaza), de 9 de julho, em meio ao último exercício de selvageria de Israel, recebi um telefonema de um jovem jornalista palestino em Gaza. Ao fundo, podia ouvir o lamúrio de seu filho pequeno, entre sons de explosões de jatos, atirando sobre qualquer civil que se mova e sobre casas. Ele acabava de ver um amigo, num carro claramente identificado como “imprensa”, voar pelos ares. E ouvia gritos ao lado de sua casa, após uma explosão — mas não podia sair, ou seria um alvo provável. É um bairro calma, sem alvos militares – exceto palestinos, que são presa fácil para a máquina militar de alta tecnologia de Israel, abastecida pelos Estados Unidos. Ele contou que 70% das ambulâncias haviam sido destruídas e, até aquele momento, mais de 70 pessoas [o número subiu para 120 na sexta, 11/7, segundo o Guardian] haviam sido mortas e 300 feridas – cerca de 2/3, mulheres e crianças. Poucos ativistas do Hamas, ou instalações para lançamento de foguetes, haviam sido atingidas. Apenas as vítimas de sempre.
É importante entender como se vive em Gaza, mesmo quando o
comportamento de Israel é “moderado”, no intervalo entre crises
fabricadas, como esta. Um bom retrato está disponível num relatório da UNRWA
(a agência da ONU para refugiados palestinos) preparado por Mads
Gilbert, o corajoso médico norueguês que trabalhou extensivamente em
Gaza, mesmo durante os ataques mortíferos de Israel. A situação é
desastrosa, por todos os ângulos. Gilbert narra: “As crianças palestinas
em Gaza sofrem imensamente. Uma vasta proporção é afetada pelo regime
de desnutrição imposto pelo bloqueio israelense. A prevalência de anemia
entre menores de dois anos é de 72,8%; os índices registrados de síndrome consuptiva, nanismo e subpeso são de 34,3%, 31,4% e 31,45%, respectivamente”. E estão piorando.
Quando Israel está em fase de “bom comportamento”, mais de duas
crianças palestinas são mortas por semana – um padrão que se repete há
14 anos. As causas de fundo são a ocupação criminosa e os programas para
reduzir a vida palestina a mera sobrevivência em Gaza. Enquanto isso,
na Cisjordânia os palestinos são confinados em regiões inviáveis e
Israel tomas as terras que quer, em completa violação do direito
internacional e de resoluções explícitas do Conselho de Segurança da ONU
– para não falar de decência.
E tudo isso vai continuar, enquanto for apoiado por Washington e tolerado pela Europa – para nossa vergonha infinita. (Noam Chomsky)
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